Delação Premiada: Aspectos relevantes no ordenamento jurídico brasileiro

Resumo

Este artigo aborda o instituto da Delação Premiada, investigando se ele infringe ou não a Constituição do Brasil. Foi realizada uma pesquisa teórica que explorou a origem da prática da delação premiada, sua adoção em diversos países e como é aplicada no Brasil. Concluiu-se que a delação premiada é uma prática antiga, que beneficia indivíduos que fornecem informações úteis às autoridades. Com a Lei 12.850/13, que combate organizações criminosas, a delação premiada foi formalmente incorporada à legislação brasileira. A análise sugere que, quando aplicada conforme as diretrizes legais, a delação premiada não viola a Constituição Federal e contribui significativamente para reduzir a criminalidade, compensando as limitações do Estado em resolver crimes e identificar os culpados.

Palavras-chave: Delação Premiada. Pesquisa. Legislação.

Plea Bargaining: Relevant aspects in the Brazilian legal system

Abstract

This article examines the Delation Agreement (Delação Premiada) in Brazil, focusing on its constitutionality. A theoretical research was conducted to trace the origins of this practice, its implementation in various countries, and its specific application within Brazilian law. The study finds that the Delation Agreement is an age-old practice that benefits individuals who provide valuable information to authorities. It became a formal part of Brazilian legislation with the enactment of Law 12.850/13, which aims to combat organized crime. The findings indicate that when implemented according to legal guidelines, the Delation Agreement does not contravene the Brazilian Constitution and significantly aids in reducing crime, thus compensating for the state’s shortcomings in solving crimes and identifying perpetrators.

Keywords: Plea bargaining. Search. Legislation.

1 INTRODUÇÃO

A delação premiada, um instituto já antigo no direito, tem suas raízes históricas desde o período bíblico, estendendo-se por diversas eras e culturas até sua incorporação em sistemas jurídicos modernos como os dos Estados Unidos, Reino Unido e Itália. Nesses países, a prática evoluiu e tornou-se parte integrante dos respectivos sistemas legais, empregada em diversos contextos, desde o combate ao terrorismo até o enfrentamento do crime organizado. A delação premiada foi particularmente instrumental na Itália dos anos 70 contra a máfia, e ganhou destaque com a atuação do magistrado Giovanni Falcone, que usou o instituto para desmantelar a Cosa Nostra.

No Brasil e em outros países da América Latina, como a Colômbia, a adoção da delação premiada também reflete essa tendência global de utilizar a colaboração dos acusados como ferramenta de investigação. Os requisitos para sua aplicação incluem a colaboração espontânea, a efetividade das informações, a relevância das declarações e a compatibilidade das circunstâncias do caso com o instituto. Essas exigências visam garantir que a delação seja uma contribuição genuína para a justiça e não meramente uma estratégia para obtenção de benefícios pessoais sem o devido mérito.

As controvérsias e os debates sobre a ética e a moralidade da delação premiada continuam a permear sua aplicação, especialmente quando se considera a ampla defesa e outros princípios constitucionais. A prática, que divide opiniões entre ser vista como um necessário mal ou uma estratégia pragmática de combate ao crime, é reconhecida por sua capacidade de desconstruir redes criminosas e fornecer informações cruciais, embora seu uso deva ser cautelosamente regulado para evitar abusos e garantir a integridade do sistema jurídico.

2 DELAÇÃO PREMIADA NO BRASIL

2.1 CONTEXTO HISTÓRICO

A delação premiada no Brasil tem raízes históricas que remontam às Ordenações Filipinas de 1603, onde já se previa a possibilidade de perdão a criminosos que denunciassem outros infratores. Embora inicialmente relacionada a crimes de “Lesa Magestade” e tenha enfrentado repúdio por incentivar a traição, este mecanismo foi esporadicamente utilizado, como no caso da Conjuração Mineira em 1789, demonstrando uma contínua, embora controversa, presença na legislação brasileira. A delação voltou a ganhar destaque nas décadas de 1980 e 1990, com a intensificação do combate a organizações criminosas, culminando na sua expressa reintrodução pelo legislador na Lei nº 8.072, de 1990, sobre crimes hediondos.

Ao longo dos anos, várias leis foram promulgadas para formalizar e incentivar a delação premiada, visando principalmente combater crimes complexos e organizações criminosas. Destacam-se a Lei nº 9.807/99, que tentou sistematizar o tratamento da delação, e a Lei nº 12.850/2013, que consolidou o termo “colaboração premiada” e estabeleceu critérios específicos para sua aplicação, como a necessidade de colaboração voluntária e eficaz do delator, além de prever medidas de proteção e segurança para os colaboradores e suas famílias.

A Lei 12.850/2013, que trata do combate às organizações criminosas, aprimorou significativamente a legislação sobre delação premiada, exigindo que os acordos sejam negociados com a presença de advogados e que sejam formalizados com detalhamento das condições e resultados esperados. Essa lei exige que o juiz analise a efetividade da colaboração na sentença, não podendo condenar com base apenas nas declarações do delator, o que confirma a preocupação com a justiça e a precisão na aplicação desta ferramenta. Com a Operação Lava Jato, a delação premiada ganhou maior visibilidade e pode transformar significativamente a aplicação prática e o entendimento doutrinário deste instrumento no sistema penal brasileiro.

2.2 MOTIVAÇÃO DA INTRODUÇÃO DA DELAÇÃO PREMIADA NO BRASIL

Qualquer sistema jurídico penal visa reprimir delitos, proporcionando uma punição adequada que não só penalize, mas também promova o arrependimento do infrator, prevenindo futuras reincidências e facilitando sua reintegração na sociedade. No entanto, é fundamental que as políticas criminais evoluam em consonância com os desafios impostos por organizações criminosas cada vez mais estruturadas, que pressionam por uma justiça mais ágil e eficiente. Nesse contexto, no Brasil, a necessidade de mecanismos mais eficazes na persecução penal tornou-se evidente, especialmente para enfrentar crimes complexos e dissiminados que sobrecarregam o judiciário.

A delação premiada surge como uma estratégia crucial neste cenário, propondo-se como uma ferramenta que, respeitando as garantias constitucionais e sem diminuir a responsabilidade penal, amplia a eficiência dos processos judiciais. Ela representa uma resposta do legislador aos desafios de combater eficazmente crimes de grande escala, como corrupção, lavagem de dinheiro e sonegação, que frequentemente envolvem figuras poderosas dentro das estruturas governamentais.

Críticos, como Lescano, argumentam que, apesar de sua eficácia aparente, a delação premiada pode ser vista como uma solução simplista que depende excessivamente da colaboração dos infratores, possivelmente comprometendo princípios fundamentais de justiça penal. A delação não só busca compensar deficiências investigativas do Estado, mas também levanta questões sobre a equidade do sistema penal, que deve garantir que cada indivíduo responda adequadamente pelos crimes cometidos, sem que benefícios possam subverter a integridade do processo legal.


2.3 A CONSTITUCIONALIDADE DA AMPLA DEFESA

A Constituição Federal do Brasil é marcada pelo garantismo, assegurando no processo penal o direito ao silêncio, à defesa ampla e ao contraditório, conforme previsto no artigo 5º. Este contexto abriga a controvérsia sobre a “Colaboração Premiada” (delação premiada), proposta pela Lei 12.850/13, que divide opiniões entre a proteção dos direitos individuais e os interesses do Estado em combater crimes, especialmente em um cenário de criminalidade crescente que demanda respostas mais rígidas da justiça.

Por outro lado, críticos da delação premiada, aqui podemos citar um dos mais destacados, o ministro Gilmar Mendes, argumentam sobre sua potencial inconstitucionalidade, enfatizando que pode violar princípios éticos e morais, promovendo uma cultura de traição e enfraquecendo a lei. Este argumento destaca que a delação, ao incentivar a cooperação do acusado em troca de benefícios, pode comprometer a integridade do sistema jurídico e contrariar os objetivos do direito penal de proteger bens jurídicos valiosos, conforme exposto por Santos (2007).

Contudo, a jurisprudência majoritária vê a delação premiada como uma ferramenta legítima e constitucional, que não apenas facilita a aplicação da lei, mas também respeita a liberdade do acusado de escolher cooperar, uma decisão que não é imposta, mas voluntária, aqui podemos destacar os ministros Luís Roberto Barroso e Edson Fachin como defensores da ferramenta. Este mecanismo é defendido como uma forma de o Estado compensar suas limitações na persecução penal, oferecendo uma solução pragmática para lidar com crimes complexos e organizados, reforçando, assim, a eficácia do sistema judicial em resposta ao clamor por segurança e justiça da sociedade.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O instituto da delação premiada tem sido um recurso valioso no combate ao crime organizado no Brasil, especialmente na luta contra a corrupção de agentes públicos. Esse método tem recebido críticas por uma minoria que argumenta que ele infringe garantias constitucionais e pode parecer um privilégio desmedido para os criminosos que decidem colaborar com a justiça. Por outro lado, sua eficácia é questionada no combate a crimes como o tráfico de drogas e homicídios, devido ao risco iminente à segurança do delator e de sua família, tendo em vista as deficiências dos programas de proteção a testemunhas no país.

A Lei 12.850/13 introduziu mudanças significativas que expandiram os benefícios do instituto da delação premiada, como a possibilidade de substituir penas de prisão por restritivas de direitos e a oferta de acordos de delação após a condenação ter transitado em julgado. Essas alterações ampliaram consideravelmente a aplicabilidade da delação premiada, reforçando sua posição como uma ferramenta crucial na elucidação de crimes complexos, em especial os de colarinho branco, e resultando na prisão de muitos criminosos influentes.

Contudo, existem preocupações substanciais quanto à possibilidade de abusos, como a delação falsa contra corréus, possivelmente incriminando inocentes em troca de benefícios. Por isso, é fundamental que as delações não sejam a única base para condenações, devendo ser corroboradas por outras provas concretas. Essa precaução é essencial para garantir que o uso da delação como meio de prova contribua efetivamente para desmantelar organizações criminosas e resolver crimes complexos, sem comprometer a justiça e a integridade do sistema legal.

Em suma, apesar das críticas e das preocupações relacionadas à sua constitucionalidade e à possibilidade de abusos, a delação premiada tem sido uma ferramenta eficaz no combate ao crime organizado no Brasil. Em um contexto de aumento da criminalidade e da sofisticação das organizações criminosas, o instrumento parece mais uma necessidade do que uma opção, com os benefícios superando os riscos. Assim, o instituto não só permanece como parte integral do ordenamento jurídico brasileiro, mas também como um meio necessário para assegurar a ordem pública e a justiça em casos especialmente complexos.


REFERÊNCIAS

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